sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016
Carta #1
Oi Baby,
Sou eu de novo, pensando em você, de novo, como se eu estivesse no ônibus da volta do trabalho, de novo, procurando seus pés em meio a sapatos tristes, de novo.
Só que eu não estou voltando do trabalho - pedi as contas - é só uma analogia, já que meu corpo está balançando, como quando eu voltava do trabalho.
Além do trabalho, abandonei a terapia, o futebol e o curso de escrita. Há tantas coisas que não posso fazer sem você, mesmo nas que você não me acompanhava, sentia sua falta, na ida e na volta. Parei de ir.
Doei o cachorro na terceira vez que ele latiu seu nome, já tinha avisado nas outras duas.
No suco verde de hoje cedo, moí a última violeta.
Os lençóis e fronhas com seu cheiro, os panos de prato com desenhos, as passadeiras da cozinha, despachei, enrolados no tapete da sala.
O sofá ficou bem magrinho sem aquele tecido macio, que lembrava sua pele.
Não sabia direito quais eram meus livros e quais eram os seus, quais eram os meus discos e quais eram os seus, quais eram os meus remédios e quais eram os seus:
Eles sim, agora estarão juntos para sempre.
Pensei em te mandar a parede da sala, onde escrevi uma carta bonita um dia desses.
Desenhei corações na porta do nosso quarto.
Não leia o que está escrito na porta do banheiro.
Retirei as lâmpadas da casa toda e cada vez que recorro ao interruptor ouço aquele cleck, como um coração que se parte e o complementa a escuridão que não afrouxa.
Daqui vejo a rua ainda úmida da chuva que caiu de algum olhar, as luzes já acesas criam sombras e as pessoas somem ao passar por elas, só uma ou outra reaparece do outro lado.
Vou mais para a beirada do parapeito, agarro firme a janela e me inclino pra frente, procurando pelo fim da sombra.
Lembro quando você saiu daqui batendo a porta, em segundos já atravessava a rua correndo, sumiu dentro daquela sombra grandona e não apareceu mais.
Quase serviu de desculpa prá te ligar naquela noite mesmo, mas me segurei.
Agora, ainda estou me segurando.
Sinto-me num pendulo com o mundo indo e voltando, noto alguns poucos olhares preocupados, não ligo.
Ligo pra pouca coisa, sobrou muito pouco.
Parece que eu tenho tanta coisa prá te dizer, mas tudo me escapa, tudo fica tão insignificante diante do volume enorme que faz esse buraco que encho de sua falta.
eu não tenho volta.
Caio F.
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