Nosso véio era CB demais, ô cara do bem. Ficava na miúda, não falava muito, mas sempre ligado nos movimento. Não dava pinta de ser 13, calibroso que só a porra, sempre sussa, de boa, mas minha mãe - cé loco - fechava o tempo com ele. A véia era o cão, puta que pariu, se a coisa não tivesse nos trinques - Ah moleque - ela tocava o terror em cima da galera toda.
Tudo ia nesses conformes até que um dia o pai, mando fazer uma prancha.
Cê já tá imaginando o veião numa Long, não tá? Sabe nada! O véio mandou vê numa Fun. Não brincou em serviço, uma fun de 6'5", triquilha de encaixe com ângulo aberto, fundo flat, wide point no meião, sob medida! Escolheu cor e o carai!
A mãe não boto uma fé - ixi mó kaô - soltou o verbo... e o outro só na dele, deixando ela falar, espernear. E ela:
- Tu é um cabrerão, quero ver tu entra no mar com essa pitomba!!
- Tu é o maior prego que eu tô ligada!
- Esse mar vai virar uma marola só!
- Tu é bóia, vai passar vergonha.
- Só vai ter merreca prô teu lado.
A nossa casa era meio na perifa, mas pé na areia, 2 p tu molhava o pé. Aquele marzão grande, fundo e barulhento.
Quando o pai chegou em casa com a danada, todo mundo cresceu o zóio, ele ranco na hora a camisinha - a parada era nefasta - até a mãe ficou UAAAHHH na prancha do véio.
Sem alegria nem cuidado, ele vestiu o long john, foi até a porta, olhou aquele marzão e mandou:
- Nooossa, má tá gringo hein!
O mar tava de cinema, umas onda bem formada, pouco vento, era de rebenta o blindex.
A mãe ficou boladona, mas seguro o BO, mordeu os beiço e só falou:
- Tu qué ir, tu vai, mas aqui não vai ter 0800 não!
Todo mundo congelou, o véio suspendeu a resposta, me olhou e disse:
- Aê.
E me chamou com a cabeça, fui até a porta e perguntei se eu podia tira uma chinfra também, ele me mandou um hang e deu linha, fiz que voltei, mas fiquei olhando, ele foi até a água e, sem olhar pra traz, foi indo mar adentro, primeiro pegou um jacaré, ai partiu para a arrebentação.
Nosso pai não voltou.
A parte alguma também num foi, fico ali amarradão, só executava a invenção de se surfista, sempre dentro da água, para dela não sair, eu ficava de butuca, às vez ele pingava no outside dava um 10 e voltava. E ó, casca grossa viu, até respeitava os cara do point, mas num tinha haule que cortava onda dele não, ele ia de drop nos cara e sai de dentro que esse tubo é meu, os cara se picava de lá.
A parentada fico de bobeira, uns caipirão da porra, ficavam buzinando no ouvido da mãe, que o véio "tava bilolado", uma tia dizia que era "feitiço", o irmão dizia que era doença, que tinha acontecido a mesma coisa com um primo deles que se pico prum rio e do rio nunca mais saiu, era só groselha e minha mãe cada vez mais desesperada. O fato corria a boca miúda dando conta de que na Bocadinha um novo rei do surf se criava, quando minha mãe escutou esse zum-zum, primeiro ela achou graça, um veião daquele "se criando", mas depois ralhou com o x9.
A mãe achava que tinha um ás na manga, coitada:
- Quero vê a hora que bate a larica nesse desgramado.
Mas não teve A nem B, o véi fico lá.
Passado uns 3 dias e o véio não saia da água, a gente chamava da praia, ele fazia que não ouvia, tentei ir atrás dele, mas ele foi se afastando eu fiquei com medo e voltei, nisso as vizinhas deram uma ideia na minha mãe, de noite a gente acendeu umas fogueiras na beira da praia e ficô todo mundo junto rezando e conversando, achamo que era capaz dele sair do mar e ver o que estava acontecendo. Vê só que loco! Passado uma meia hora, começou um pinga-pinga de gente, umas mina levaram comida, uns cara levaram bebida, passou um tempinho, neguinho trouxe um back, colou um cara com o violão e tudo virou o maior luau, a mãe saiu pisando duro. Lá pelas tantas rolou um ninguém-é-de-ninguém, meu amigo...
Acabou, que começou a se tornar um evento repetitivo, toda lua cheia tinha luau e com todo aquele teretetê. Em casa eu não comentava nada, se não sujava, mas saia na miúda, depois que todo mundo dormia e voltava antes do amanhecer. Foi assim por um tempão, até que num desses dia aconteceu um negócio que me deixou gelado. Eu não tava chegando no point e dei de cara com a prancha de meu pai espetada na areia? Já fui procurando de cara em cara e nada de vê o pai, pintou até uma dúvida, será que eu não lembrava mais da cara do véio?
Pisquei e a prancha não sumiu? Fiquei de butuca na praia até o dia clarear até conseguir ver se ele continuava mesmo no mar, se não tinha sofrido algum acometimento, mas vi ele, lá lonjão.
Por conta do ocorrido acabei chegando mais tarde em casa e minha mãe, já levantada, começou a pesar na minha, ela não botou fé que eu não tinha ido na festa:
- Ah, tu num foi não abestado? Então venha cá que vou lhe cheirar.
Cheiro meu cabelo, cheiro minha camisa, cheirou minha orelha, meu nariz, minha boca, meu sovaco, Deus do céu de repente ela ia querer cheira meu cu! Pelo menos deu tempo de inventar uma história pra contar, se não ia acabar dizendo que tinha ido na festa mesmo.
- Ah mãe. Eu falei.
- Eu fui vê se o pai tava lá. Porque eu sonhei que o pai saia da água de noite e ia dar uns rolezinho com a rapeize.
Rummm! A mulher ficou branca, parecia que ia ter um troço - pior que no dia que ele foi embora - mixou a conversa. Ela foi fazer as coisas dela mas se via que remoia nosso conversê, fiquei preocupado, mas não teve jeito de volta no assunto com ela, ela saiu antes do almoço e só voltou no finzinho da tarde - coisa que ela nunca tinha feito - voltou com ar de resolvida.
Fez a janta, deitou-se cedo e tudo correu normal nos outros 2 dia dando pinta de que o problema tinha ido com a maré, mas no terceiro dia entregaram em casa uma caixona, a mãe fez cara de criança ganhando brinquedo.
Agora tô eu aqui sem saber que rumo dá na minha vida.
Da caixa aberta minha mãe tirou uma prancha de body board.
Disse só:
- Vô mais teu pai, cuida das criança.
E rapou de casa.
Deu ruim heim!